domingo, 20 de maio de 2007

Sexo Virtual


Fonte : André Machado - jornal O Globo / ´´ Informática Etc. ´´ - 10/07/2006

Mundos virtuais eróticos e RPGs centrados no prazer povoam a internet e permitem criar personagens voluptuosos para relações virtuais em vários cenários

A expressão "sexo virtual" ganhou uma nova conotação. Não se refere mais só a sites de encontros ou sites eróticos ou pornográficos. Agora a vez é a dos mundos e jogos virtuais centrados no sexo. Já existem alguns funcionando nos EUA, como o Sociolotron, o Jewel of Indra e o Red Light Center. Também está chegando o Naughty America. A maioria é paga através de assinaturas mensais. E todos eles, sem exceção são voltados para maiores de 18 ou 21 anos, pedindo que o usuário confirme ser maior de idade antes de entrar no site.

Em essência, os mundos virtuais eróticos são como qualquer outro mundo virtual: gráficos 2D ou 3D, chats, eventos e locais temáticos. Mas eles não poderiam ser mais diferentes entre si. O Jewel of Indra, por exemplo, segue o estilo universo paralelo. Na verdade, é uma comunidade de chat em três dimensões, que tem moradores com seus avatares. "Somos um portal para todas as coisas adultas, sexuais e picantes", diz a descrição no site.

O Jewel deixa bem claro que não é um game. Os muitos avatares são bonitos e com corpos voluptuosos, e podem escolher andar nus pelo lugar. Há várias áreas para encontros virtuais, um banco de imagens eróticas, casas 3D que se pode escolher para morar, música "climática", filmes adultos (que passam na casa 3D do avatar), e até dinheiro virtual, chamado Community Credits. Esse dinheiro pode servir para transações de compra e venda de objetos 3D criados pelo próprio personagem do usuário.

Áreas para heteros, gays e sexo em grupo


As áreas são separadas por categoria. Há áreas para nudistas, heteros, gays e lésbicas, para os amantes do sexo grupal e até "sexo gótico", seja lá isso o que for. Há eventos de vários tipos - jogos, festas online, caçadas (como pequenos RPGs dentro do mundo virtual), palestras... O Jewel tem ainda a vantagem de apresentar chat falado (usando a tecnologia TTS - text to speech), e o personagem pode escolher sua própria voz.

Já o Sociolotron é bem mais barra-pesada. Trata-se de um RPG para adultos que querem viver suas fantasias ao máximo. Não se trata só de matar monstros (embora eles existam no game), mas de se misturar com avatares de outras pessoas, sair com eles, transar, e até mesmo constituir família. Mas há o "lado negro da Força" nesse game, que permite coisas como prisões, chantagens, perversões e até assassinatos. E aí o avatar "morre" mesmo, sem a chance de ressurreição como em outros RPGs. A idéia, segundo os criadores do game, é deixar que os próprios jogadores resolvam suas disputas online.

Um game politicamente incorreto até dizer chega

O game aborda assuntos complicadíssimos como intolerância religiosa e racial, drogas, prostituição, sexo nada seguro e blasfêmias diversas. Não poderia ser mais politicamente incorreto, e por isso mesmo avisa com todas as letras que nada que acontece no RPG deve ser levado para o mundo real. Inclusive, o jogo não dá nenhum contato dos donos dos avatares na vida real e desencoraja totalmente os jogadores de se encontrarem no dia-a-dia. Algo que é, ao contrário, encorajado no Jewel of Indra, que já teve casais reais formados depois de primeiros encontros como avatares, na rede.

O Sociolotron tem cultos baseados em práticas sexuais e seus avatares têm uma espécie de nível de tesão (sexual urge). Naturalmente, podem configurar suas preferências (hetero, gay etc). O sistema de cibersexo tem vários tipos de posições e o sadomasoquismo é livre - quem curte submissão, algemas, chicotes, correntes e outros fetiches pode usá-los virtualmente. Ah, e os personagem podem ter filhos que sejam seus herdeiros em caso de morte permanente.

Outro mundo do sexo é o Red Light Center, totalmente pornô. Os avatares são especialmente voluptuosos aqui, e o site alardeia ter milhares de filmes de sexo. Há clubes de strip-tease, discotecas em que se dança nu, quartos de motel e eventos onde se pode trocar histórias eróticas, em chats com voz. Esse ambiente virtual é voltado somente para o sexo e também pode levar a encontros reais.

O quadro de eventos também inclui shows de danças exóticas, concursos de tatuagens e outras festas centradas em transas.

A próxima atração na esfera dos mundos "sexy" virtuais será o Naughty America, que será inaugurado em breve. A idéia do game é ser o mais picante (naughty) possível, com sexo grupal e em todas as posições possíveis, festas repletas de erotismo e atividades voyeurísticas. Os avatares poderão "filmar" suas transas e mostrar para os amigos.

Zona boêmia e clima de praia nos muitos cenários

Como os demais universos, o Naughty America também tem vários cenários. Em Downtown fica a vida noturna: boates, becos escuros, sex shops, apartamentos e fliperamas. Já Uptown tem cafés, um cassino, um parque e condomínios de luxo. The Beach (a praia) apresenta casas de veraneio, cruzeiros em navios, calçadão para paqueras, clubes com bares à beira da piscina e assim por diante. Esse game conta com suporte a webcams se a coisa entre os avatares ficar mais quente.

A lista de mundos é interminável. Tem até o peep show Virtually Jeena, em que o usuário pode transar (virtualmente) com a stripper no fim. Além do Naughty America, estão chegando ainda à rede o Virtual Hottie 2 e o Rapture Online, da Black Love Interactive.

A questão é: enquanto permanece virtual, as pessoas realmente conseguem tirar prazer do sexo? Fizemos a pergunta ao psicanalista Alberto Goldin.

- O mundo da fantasia está se tornando mais real, mais concreto - diz Goldin. - A fantasia solitária era como um filme subjetivo na nossa cabeça, mas a internet faz com que esse sonho se realize numa "mente" virtual à nossa frente.

Goldin explica que até agora a fantasia delirante solitária era vista como um tipo de psicose.

- É um universo irreal em que a pessoa fala e responde a si mesma, numa estrutura de um delírio paranóico. Só há um produtor aí, ninguém mais interage. Com a internet, o delírio pode ser compartilhado. Serão então os grupos todos delirantes? E com essa mudança como fica o diagnóstico da psicopatologia? Sem dúvida, é um problema para psicanalistas e sociólogos... Porque as situações objetivas nesses mundos já não se encaixam na definição tradicional de delírio.

Mas prazer ele diz que há, sim: o de não estar sozinho, mesmo virtualmente.

- O jogo masturbatório, com esses mundos, passa a não ser mais individual.

Sexo pode ser virtual, mas interação é verdadeira

Para a sexóloga Regina Navarro Lins, autora do "Livro de ouro do sexo", as pessoas ainda não concebem direito a idéia do cibersexo, mas isso vai mudar.

- Muita gente se choca com esses mundos e chats de sexo, diz que sexo real não é isso, que precisa ter as duas pessoas presentes, um clima, etc - diz. - Mas não se pode comparar esse sexo virtual com o sexo real. O sexo virtual é um tipo diferente de relação. E, muito embora ele possa ser virtual, a interação que você tem com a outra pessoa, mesmo oculta por seu personagem, é real. Há um "timing" mesmo no sexo virtual; os dois lados precisam interagir e decidir como funciona melhor a relação. O sexo online pode, assim, ser bom ou não.

Regina vaticina que estamos entrando numa nova fase da história da humanidade, em que o virtual vai invadir de vez nossas vidas, e a cabeça das novas gerações vai acompanhar isso. Talvez aí o cibersexo seja mais bem compreendido e apreciado.

'O jogo masturbatório, com esses mundos na internet, passa a não ser mais uma coisa individual. Há o prazer de não estar sozinho, mesmo virtualmente' ALBERTO GOLDIN,psicanalista

'Há um timing mesmo no sexo virtual; os dois lados precisam interagir e decidir como funciona melhor a relação. O sexo online pode, assim, ser bom ou não' REGINA NAVARRO LINS, sexóloga

domingo, 13 de maio de 2007

Neo e o Arquiteto

Dialogo entre Neo e o Arquiteto


O Arquiteto - Olá Neo.

Neo – Quem é você?

O ArquitetoEu sou o Arquiteto. Eu criei a Matrix. Eu estava esperando por você. Você tem muitas perguntas, e embora o processo tenha alterado sua consciência, você permanece irrevogavelmente humano. Portanto, algumas das minhas respostas você vai entender, e algumas delas não. De forma concordante, enquanto sua primeira pergunta talvez seja a mais pertinente, você pode ou não perceber que ela é também irrelevante.

Neo – Por que eu estou aqui?

O Arquiteto Sua vida é uma soma de um resíduo de uma equação desequilibrada inerente à programação da Matrix. Você é a eventualidade de uma anomalia, a qual, apesar de meus mais sinceros esforços, sou incapaz de eliminar do que é, de outra forma, uma harmonia de precisão matemática. Enquanto isto continua sendo uma aflição a ser aplicadamente evitada, ela não é inesperada, e dessa forma não está além de uma medida de controle. E foi isso que, inexoravelmente, trouxe você aqui.

Neo – Você não respondeu a minha pergunta.

O Arquiteto - Correto. Interessante. Você foi mais rápido que os outros.

(É então que aparece nos monitores o que NEO poderia ter dito ou feito: Outros? Que Outros? Quantos? Responda-me!)

O ArquitetoA Matrix é mais antiga do que você imagina. Eu prefiro começar a partir do surgimento de uma única anomalia integral até o surgimento da próxima, e neste caso, esta é a sexta versão.

(Novamente aparece nos monitores o que NEO poderia ter dito: Cinco versões? Três? Eu tenho sido enganado também. Isso é mentira!)

Neo – Há apenas duas possíveis explicações: ou ninguém me contou, ou ninguém sabe nada.

O ArquitetoCertamente. Como você está indubitavelmente captando, a anomalia é sistemática, criando flutuações até mesmo nas equações mais simplistas.

(Demonstra então nos monitores a violência que NEO poderia ter usado: Você não pode me controlar! Dane-se! Vou matar você! Você não pode me obrigar a fazer nada!)

Neo – Escolha. O problema é escolha.

O ArquitetoA primeira Matrix que eu projetei era naturalmente perfeita, era uma obra de arte, sem defeitos, sublime. Um triunfo igualado somente por sua monumental falha. A inevitabilidade de sua perdição é evidente para mim agora como uma conseqüência da imperfeição inerente a cada ser humano. Dessa forma, eu a reprojetei baseada na história humana para refletir, com mais precisão, os variantes aspectos grotescos de sua natureza. No entanto, eu fui novamente frustrado pela falha. Desde então, comecei a entender que a resposta me iludiu porque ela requeria uma mente menor, ou talvez uma mente menos limitada pelos parâmetros da perfeição. Dessa forma, a resposta se colocou no caminho de outra, um programa intuitivo, inicialmente criado para investigar certos aspectos da psiquê humana. Se eu sou pai da Matrix, ela seria, sem dúvidas, sua mãe.

Neo – O Oráculo.

O ArquitetoPor favor. Como eu estava dizendo, ela se colocou no caminho de uma solução, segundo a qual aproximadamente 99,9% de todas as pessoas testadas aceitaram o programa, desde que fosse dada a elas uma escolha, mesmo se elas estivessem cientes dessa escolha em um nível quase inconsciente. Enquanto essa resposta funcionou, ela era obviamente defeituosa em sua essência, criando, dessa forma, a contraditória anomalia sistemática, que, se não for verificada, pode ameaçar o sistema em si. Portanto, aqueles que recusaram o programa, enquanto uma minoria, se não forem verificados, podem constituir uma probabilidade agravante de desastre.

Neo – Isto é sobre Zion.

O ArquitetoVocê está aqui porque Zion está prestes a ser destruída. Cada um de seus habitantes exterminados, sua existência inteira erradicada.

Neo – Mentira!

O Arquiteto A negação é a mais previsível das reações humanas. Mas, tenha certeza, esta será a sexta vez que destruímos Zion, e temos nos tornado excessivamente eficientes nisto.

O ArquitetoA função do Predestinado é agora retornar à Fonte, permitindo uma disseminação temporária do código que você carrega, reinserindo o programa principal. Depois disso, você terá que escolher 23 indivíduos da Matrix, 16 mulheres, 7 homens, para reconstruir Zion. A falha no cumprimento deste processo vai resultar em uma cataclismática queda do sistema, matando todos que estão conectados à Matrix, o que, aliado à exterminação de Zion, resultará finalmente na extinção de toda a raça humana.

Neo – Você não vai deixar isso acontecer, você não pode. Você precisa dos humanos para sobreviver.

O Arquiteto Há níveis de sobrevivência que estamos preparados para aceitar. No entanto, a questão relevante é se você está ou não pronto para aceitar a responsabilidade pela morte de cada ser humano neste mundo

(O Arquiteto pressiona um botão e aparecem nos monitores de todas as pessoas que vivem na Matrix.)

O ArquitetoÉ interessante ler suas reações. Seus cinco predecessores foram projetados baseados em uma predicação similar, uma afirmação contingente que foi feita para criar uma profunda ligação ao restante de sua espécie, facilitando a função do Predestinado. Enquanto os outros viveram isso de uma maneira comum, a sua experiência é muito mais específica. Amor.


(Imagens de Trinity lutando contra o Agente e caindo do prédio)

Neo – Trinity.

O ArquitetoA propósito, ela entrou na Matrix para salvá-lo ao custo da própria vida.

Neo – Não!

O ArquitetoO que nos trás, enfim, ao momento da verdade, onde a falha fundamental é finalmente expressada e a anomalia revelada tanto como um início e um fim. Existem duas portas. A porta à sua direita leva à Fonte, e à salvação de Zion. A porta à sua esquerda leva de volta à Matrix, a ela, e ao final de sua espécie. Como você adequadamente colocou, o problema é escolha. Mas nós já sabemos o que você vai fazer, não sabemos? Eu já posso ver a reação em cadeia, os precursores químicos que sinalizam o princípio da emoção, projetada especificamente para sobrepujar lógica e razão. Uma emoção que já está lhe cegando da simples e óbvia verdade: ela vai morrer e não há nada que você possa fazer para impedir isto.


(Neo caminha à saida)

O ArquitetoEsperança, a ilusão humana quintessencial, simultaneamente a fonte de sua maior força, e sua maior fraqueza.

Neo – Se eu fosse você, torceria para não nos encontrarmos novamente.

O Arquiteto Isto não acontecerá.

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IN MEMORIAN ao filósofo francês Jean Baudrillard ( 1930 /2007 )que ajudou a inspirar os irmãos Wachowski a fazerem a trilogia de "Matrix" com o livro "Simulacros e simulação"
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domingo, 6 de maio de 2007

Universo virtual




Se nos rimos ao imaginarmos o universo descrito nos filmes da trilogia "Matrix", ou em livros como o Snow Crash ou dos eternos William Gibson e Bruce Stirling, a verdade é que pensamos sempre num futuro longuínquo - 2015, 2020, enfim, algures daqui por uns bons aninhos...

"Realidade virtual fotorealista" com "imersão total" é algo que é tecnologicamente possível em 2005. Um Cray II é capaz de gerar imagens com esse grau de qualidade, em que os nossos sentidos sejam totalmente iludidos. Talvez um parque de workstations Silicon Graphics também consiga o mesmo efeito.

No entanto, continuamos a rir-nos, pois sabemos que isso não está ao alcance das nossas bolsas... nem temos largura de banda suficiente para manter a largura de banda necessária para uma tecnologia desse tipo. Logo, a "Matrix" ou o "Metaverse" são sonhos, explorados pelos autores de ficção científica.

Mas esquecemo-nos do nosso passado recente. Em 1969, um computador com 16 K de memória pousou dois homens na Lua. Hoje em dia, até um mero cartão "smart card" tem muito mais do que isso. Uma vulgar calculadora gráfica de bolso (ou um telemóvel...) tem mais capacidade de computação do que os mainframes do Ministério das Finanças instalados em 1977. Nesse sentido, rirmo-nos do que será capaz o computador pessoal de 2020, é simplesmente falta de visão .

A Matrix já existe hoje - na sua versão 0.01. Chama-se (apropriadamente!) Second Life™, com cerca de vinte e três mil "habitantes", e encontra-se acessível em http://secondlife.com/. É um projecto comercial (que se prevê tornar-se open source em breve) da empresa californiana Linden Lab - uma micro-empresa com custos reduzidíssimos que colocou 500 servidores Linux online para "suportar" a "grelha" - o nome oficial da "Matrix" nesta realidade virtual.

Com aplicações cliente para Windows e Mac (a versão Linux está em desenvolvimento), o universo virtual ainda não é 100% fotorealista, embora os avatares - representações virtuais das nossas pessoas enquanto estamos ligados ao sistema - tenham um grau de realismo próximo ao da Princesa Fiona no filme de desenhos animados Shrek. Muito aceitável, e totalmente configurável, a pormenores esotéricos como a distância da curva inferior do olho ao nariz :)

Ao contrário de muitas outras plataformas, esta foi desenvolvida para que o trabalho criativo - a construção do mundo virtual - seja totalmente desenvolvida dentro da própria plataforma. Assim, mesmo um "novato" em construção de modelos 3D, rapidamente aprende a juntar "blocos de Lego" e construir casas, objectos, veículos, mobília... e a programá-los, animá-los, fazê-los interagir com outros avatares (e outros objectos), ou até com "recursos externos" (servidores web e aplicações remotas).

Na realidade, a empresa Linden Lab não produz "conteúdo" - apenas fornecem a tecnologia para que os participantes da realidade virtual construam o "seu" mundo. O papel deles é de fornecer ferramentas, não de fornecer soluções pré-configuradas.

Interacção - entre objectos, mas também entre pessoas representadas pelos seus avatares - é o aspecto predominante da tecnologia por trás do Second Life™. A sociedade virtual é bastante complexa, e, dado que o Second Life™ se encontra "modelado" na "vida real", é natural que surjam o mesmo tipo de associações e interacções sociais. Mais uma vez, não existe nenhum "controlo" ou "encaminhamento" por parte dos criadores da plataforma, que são meros "observadores". As comunidades virtuais que aqui se constróiem lembram outras que já existem na Internet - as comunidades Yahoo ou MSN, as comunidades como o Orkut ou Gazzag, ou ainda as "antigas" comunidades baseadas em IRC.

Todas estas baseiam-se essencialmente em "chat" - conversa textual - embora possam ser mais ou menos rebuscadas. Modelos como os MUDs e MUSHs - onde centenas ou milhares de pessoas dialogavam num ambiente textual, em que existiam descrições de quartos, casas e cidades, são os antecessores destas novas realidades virtuais em 3D - que por sua vez são percursoras da "imersão total", antevista em filmes como Matrix, e proclamadas por Stephenson, Stirling ou Gibson nos seus romances.

Em muitos romances, as antevisões das realidades virtuais concentram-se em dois aspectos: entertenimento e uma ferramenta de trabalho colaborativo. O "entertenimento" geralmente é apresentado como zonas onde grupos de pessoas, com as mesmas afinidades, se juntam para conversar e passar um bom bocado juntas - em bares ou discotecas virtuais, ou em jogos interactivos, onde a imaginação é o limite. É assim, por exemplo, em Otherland de Tad Williams. Curiosamente, Second Life™ recria esse modelo, mas acrescenta-lhe uma complexa economia, fruto da sua existência há alguns anos.

O fascinante nessa economia é o facto de ser possível trocar "dinheiro de jogo" por US dólares, graças à imaginação e criatividade de alguns participantes. Isto significa que é possível ganhar dinheiro fazendo negócios na realidade virtual! Há quem consiga mesmo tirar um salário mensal de € 2000-4000 - mas são excepções. Seja como for, é razoavelmente fácil conseguir-se pelo menos ganhar dinheiro suficiente para pagar as despesas da ligação - conectividade em banda larga e custos com o acesso à plataforma.

O acesso é barato. Em termos de conectividade, é mesmo necessária banda larga - o acesso vai consumir cerca de 100 kbps contínuos, podendo em picos aumentar. Em termos de hardware, recomenda-se vivamente mais de 512 MB de RAM, e uma placa gráfica razoável, ATI ou RADEON, com um mínimo de 32 MB (nem todas são suportáveis).

Qualquer Mac G4 pode correr esta plataforma, assim como a esmagadora maioria dos PCs com menos de três anos de idade. Em termos de custos de acesso aos sistemas centrais - a grid, um parque de cerca de 500 servidores Linux que "contêm" o Second Life™ - só é necessário pagar US$ 9,95 - aproximadamente € 7,70 - para "toda a vida". Trata-se de um "acesso básico" à plataforma, limitado apenas à impossibilidade de "adquirir terra".

É que a empresa que criou a plataforma - a Linden Lab - não fornece o "conteúdo" mas sim a aplicação de acesso à "grid", a manutenção dos servidores, e o suporte técnico (que é fenomenal). Todo o conteúdo - todas as construções 3D no interior da realidade virtual - é fornecido pelos próprios utilizadores!

No entanto, dependendo dos recursos consumidos - CPU dos servidores e largura de banda - é necessário mais "terra", uma medida abstracta que representa a "capacidade de construção". Esta terra paga uma "contribuição autárquica" - um punhado de US$ mensais, pagos à Linden Lab, consoante a área desejada (área essa que determina a capacidade de construção).

No entanto, alguns utilizadores alugam terreno para construção - permitindo assim a utilizadores de "acesso básico" poderem desfrutar do prazer de construção 3D sem necessidade de pagamento de "contribuições autárquicas". Claro que convém nessa situação dispor de uma fonte de rendimento própria, dentro da realidade virtual...

Este conceito é igualmente estranho para alguém que se ligue da primeira vez. Muitos dos "novatos", após os momentos iniciais de adaptação à aplicação, e algumas "visitas" às miríades de construções em todo o mundo virtual, perguntam de imediato: "e agora o que é que eu faço?" A resposta apropriada é: "o que quiseres".

O ambiente 3D faz lembrar um jogo de computador, e é certo que o nível de entretenimento e o aspecto lúdico são enormes. No entanto, o Second Life™ não é um jogo. Não há "regras" que se tenham de cumprir (as que há, são definidas pelos próprios utilizadores). Não há "objectivos". Não existe uma panóplia de coisas pré-programadas a que os jogadores de jogos de computador ou de role-playing games estão habituados: aquisição de "pontos de experiência" a matar monstros, de "pontos de equipamento" para comprarmos armas e armaduras, avançar em "níveis de dificuldade", aprender "profissões", etc.

Esses conceitos não têm qualquer cabimento na plataforma do Second Life™, que é "apenas" uma "simulação" da vida real. Existem de facto centenas de milhar de objectos para venda, mas foram todos criados pelos próprios utilizadores.

Até existem jogos dentro da própria realidade virtual - desde casinos, a jogos de xadrez, a campeonatos de tiro ao arco, corridas de cavalos, enfim, até mesmo jogos de role play ou de Paintball... Mas tudo isso foi criado pelos utilizadores para seu próprio divertimento - ou para aumentarem a sua fortuna pessoal, vendendo o "acesso" aos jogos.

Não foram criados pela Linden Lab nem "subcontratados" por esta para tornarem a plataforma mais interessante - não, emergiram espontaneamente, de justamente pessoas que à pergunta de novato: "mas agora o que é que faço?" responderam: "Bem, vou fazer um jogo..." - ou um parque de diversões, ou um templo de retiro espiritual, ou um centro comercial, ou um hipódromo, ou uma cidade cyberpunk, ou uma discoteca, ou uma fábrica de automóveis ou de aviões, ou uma empresa de construção civil, ou um teatro ou sala de espectáculos, ou uma universidade, ou um jardim, ou um condomínio fechado de luxo com praia e piscinas, ou...

A criatividade e a imaginação é a única limitação no Second Life™. Mas, vendo bem as coisas - não se passa precisamente o mesmo na nossa vida real?

O próximo passo, claro está, é obter uma interligação entre os dois mundos - o real e o virtual. Neste momento existem imensas tentativas do género. Universidades americanas estudam comportamentos sociais ou planeamento urbano usando o Second Life™.

Uma universidade inglesa procura reconstruir um teatro grego, com o objectivo de fomentar a exibição de dramatizações clássicas. Uma entidade de auxílio a deficientes motores utiliza a plataforma para permitir aos seus doentes uma socialização sem preconceitos (ninguém sabe o "aspecto físico real" por trás de um avatar...).

Outras entidades utilizam a plataforma como salas de aula e ferramentas extra-curriculares para fomentar a percepção espacial, a geometria 3D, mas também o incentivo à utilização de ferramentas de artes gráficas e de animação (cujos resultados podem ser importados para a plataforma). Há entidades que usam a plataforma como uma ferramenta de desenvolvimento rápido de conceitos para jogos de computador (porque não?) - é fácil e rápido de obter não só uma aplicação pronta e funcional, mas de testar conceitos inovadores, com uma audiência de 23.000 pessoas.

Outros procuram simular modelos económicos e testar a sua viabilidade antes de os lançarem no "mundo real". E outros ainda usam a plataforma como a nova killer application para conceitos como e-Learning, videoconferência ou trabalho colaborativo - que realmente funcionam devidamente no Second Life™, de uma forma integrada, ao contrário das tentativas mais ou menos frustradas que têm sido utilizadas na Internet.

Os visionários pensam que este tipo de realidades virtuais irão criar uma nova mudança de paradigma em termos de comunicação pela Internet. Habituámo-nos, nos últimos 10 anos, a obter informação via Internet, a pesquisar no Google, a ler notícias, a comprar livros, CDs e roupas, tudo com um interface arcaico, 2D, cuja "interactividade" é feita por trocas de emails ou eventualmente um "chat" textual com um interlocutor.

O facto é que funciona, porque nós, seres humanos, somos infinitamente adaptáveis a novos modelos de comunicação. No entanto, as realidades virtuais são um "retorno ao passado" em termos de humaização dos processos. Em vez de sites com fotografias para comprarmos livros, entramos em "bibliotecas virtuais", modeladas em 3D, e interagimos com o livreiro/bibliotecário (que é um ser humano, tal como nós, representado pelo seu avatar), que nos aconselha quanto aos livros que podemos adquirir - tal como nas bibliotecas reais.

Da mesma forma, se quisermos comprar roupa, vamos a uma loja onde podemos testar essa mesma roupa aplicada no nosso avatar - e não procurar escolher uma coisa a partir de fotografias. Em vez de aprendermos a ler PowerPoints ou PDFs, sentamo-nos numa sala de aula virtual com os nossos colegas, onde vemos um quadro onde o professor escreve a aula, passa slides, ou mesmo pequenos filmes, e que podemos interromper com perguntas.

Um "test drive" virtual de um novo modelo de automóvel despoleta uma correria ao longo de diversas estradas no Second Life™ - e podemos tornar essa experiência tão realista quanto quisermos (sendo a única limitação o "esforço" do designer virtual em aproximar a "performance" da viatura ao modelo real). E finalmente, em vez de discutirmos de determinado produto/solução é bom ou mau, através de forums de discussão ou chats com os amigos, sentamo-nos numa esplanada virtual, a observar o pôr do sol radioso, e conversamos calmamente sobre qualquer assunto que achemos interessante!

Até existem tertúlias virtuais, muito ao género das que são promovidas pela Simetria..

terça-feira, 1 de maio de 2007

A pílula vermelha.


Este representa o primeiro grande dialogo do filme entre Neo e Morpheu, além de ser gancho para uma série de eventos posteriores ( mesmo serão vistos os personagens retornando a este local mais tarde ) também dá o tom do que virá a seguir. A conversa é para lá de reveladora e dificilmente quem a vê não sente que Morpheu esteja falando na verdade é com espectador que indiretamente se coloca no lugar de Neo naquela cadeira.


( Finalmente Neo é apresentado a Morpheu. Chove torrencialmente e o ambiente não é nada convidativo. Feitas as apresentações Morpheu pede a Neo para sentar e inicia-se a seguinte conversa )

Morpheu :

-Eu imagino que você esteja se sentindo um pouco como a Alice entrando pela toca do coelho.

( Neo está meio assustado e ao mesmo tempo se revela curioso )

Neo :

-Você tem razão.

( Morpheu sorri e brinca com descuido com uma pequena caixa de metal entre seus dedos )

Morpheu :

- Eu vejo nos seus olhos. Você tem o olhar de um homem que aceita o que vê porque está esperando acordar. Ironicamente não deixa de ser verdade.
- Você acredita em destino, Neo?

( Neo olha meio sem entender para Morpheu )

Neo :

- Não

( Já com cara séria Morpheu retruca )

Morpheu :

- Por que não ?

( De maneira rápida Neo responde )

Neo :

- Não gosto de pensar que não controlo minha vida.

( Ainda sorridente Morpheu continua, só que ao longo da conversa seu tom de voz fica mais sério )

Morpheu :

- Sei exatamente o que você quer dizer.
- Vou te contar porque está aqui : Você sabe de algo.
- Não sabe explicar o quê. Mas você sente.
- Você sentiu a vida inteira : há algo errado com o mundo. Você não sabe o que é, mas há. Como um zunido na sua cabeça te eloquecendo. Foi esse sentimento que te trouxe até mim.
- Você sabe do que estou falando?

( Neo com uma cara meio de aturdido responde quase sem voz )

Neo :

- Da Matrix ?

( troveja lá fora )

Morpheu :

- Você deseja saber o que ela é?

( já aparentando um pouco de medo Neo fala bem baixo )

Neo :

- Sim.

( Morpheu passa a encarar Neo )

Morpheu :

-A Matrix está em todo lugar. À nossa volta. Mesmo agora , nesta sala .
- Você pode vê-la quando olha pela janela ou quando liga sua TV;
- Você a sente quando vai para o trabalho, quando vai à igreja, quando paga seus impostos....
- É o mundo que foi colocado diante de seus olhos para que você não vise a verdade.

( o rosto de Neo revela confusão )

Neo :

- Que verdade?

( sem alterar o tom de voz e ainda mantendo o olhar fixo para Neo , Morpheu fala )

Morpheu :
- Que você é um escravo. Como todo mundo, você nasceu num cativeiro, nasceu numa prisão que não pode sentir ou tocar. Uma prisão para sua mente.
- Infelizmente é impossível dizer o que é Matrix. Você tem que ver por si mesmo.
- Esta é a última chance . Depois não há como voltar .

( sem pensar duas vezes Neo parte para tomar a pílula vermelha e antes que o faça Morpheu diz : )

Morpheu :
- Se tomar a pílula azul a história acaba e você acordará na sua cama acreditando no que quiser acreditar.
- Se tomar a pílula vermelha ficará no País das Maravilhas e eu te mostrarei até onde vai a toca do coelho.

( De novo Neo vai em direção de pegar a pílula vermelha e Morpheu dá o que será sua última advertencia )

Morpheu :
- Lembre-se tudo o que ofereço é a verdade . Nada mais.

( Neo toma a pílula e é conduzido para outra sala. A aventura começa ! )